«A publicação de um livro obriga-nos, para além de todo o tempo que estivemos intimamente ligados à sua estruturação, na sua densa propriedade espiritual, veiculada por uma vasta sinergia de experiências que se evolam nessa insular correlação, a uma bilateral correspondência entre a obra imaginada e o seu demiurgo. Importa saber, numa primeira instância, qual a génese, qual o motivo ou estreme inquietação que provocou essa necessidade invulgar. Neste caso, o livro Essência do desacerto propõe esse processo de análise, por mais falível que seja, por mais árdua que se torne, por mais inócua que se verta essa tentativa. Todo o livro é a aceitação final da imaginação, desde a mais remota até à mais desconhecida, que se cristalizou nas suas páginas constituintes. Todo o mais que tenha falhado em ser dito apenas se pode vislumbrar ou saber na fluidez e na desmesura de um regresso improvável, contudo não impossível, ao estado primeiro da mais ténue recordação que tudo originou. Tentar a sincronização com a alma profunda que incitou a procura é, de alguma forma, a consciencialização do espaço imagético, embora raramente implícito na obra criada, onde o conhecimento evoluente se codificou e descodificou no seu texto final. É para um ser humano totalmente misterioso saber quais as leis ou quais as forças que impeliram para o acto criativo. Daqui resultam todas as mais insondáveis perguntas, que de certo modo perseguirão qualquer pessoa na sua relação consigo mesmo.»
o toque
a panaceia morna do descuido consentido
a exuberante infiltração de calor vibrátil das formas endémicas
toda a comoção de um ser exercita sua morte nesse gesto
até torná-la perfeita
insuportável
creio numa encarnação futura através de gestos que se procurem
musicalmente adestrados numa vida propedêutica
como o virar de uma página de livro
um entrelaçar de mãos
uma quase inaudível entoação sibilante de lábios
em tonalidades de palavras evoladas na ausência
rosácea dos corpos
toda a leveza do toque tem o crepúsculo das libélulas
petrificadas num movimento de inanidade
em que férteis dilaceram a paciência
e pacientemente revolvem os precipícios
nessa leveza seguro o cálice da exígua sonolência mitológica
onde todos os reflexos urgem no metal baço de sua superfície convexa
tudo parece mais vasto informe trémulo
como uma viagem escabrosa de uma carlinga
perdida na quiromancia dos horizontes submersos
para que as manhãs nos tragam à tona
dessa primeira luz
Essência do Desacerto
Autor: F. M. Alves Mendes
P.V.P. €9,00
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